quinta-feira, 28 de outubro de 2010

CONTRADIÇÕES DA VIDA - poema, poesia e filosofia

CONTRADIÇÕES DA VIDA


Áureo João. 43. Teresina/PI, 26/10/2010

1.
Eu queria fazer belas poesias, daquelas que encantam as beldades que se guardam em castelos revestidos de granitos, portobello e cerca elétrica; grandes castelos de areia;

Eu queria poetar sobre flores do consumo do clero e da nobreza; daquelas flores que a gente compra em floricultura personalizada; flores de jardim cuidado por jardineiro contrato e assalariado exclusivo, e leão-de-chácara no portão da entrada;

Eu queria saber de meus poemas ostentados em raras molduras, em convites de festas especiais e jazigos glamourosos;

Mas no coração do poeta a flor que brotou é flor de mussambê, de alecrim do campo, de mandacaru, do marmeleiro e do ipê; é flor de roça; é flor de terreiro; encantos que não germinam em granitos nem à sombra de cerca elétrica;

A beldade que encantou o coração de poeta faz poemas na mão, no coração, na alma e na vida do poeta; e dá vida e felicidade ao poeta; anda na sombra de si mesma; caminha a pé pelos caminhos que os povos caminham;

Coração de poeta se encanta com beldade que contempla flor de mussambê, de alecrim do campo, de mandacaru, do marmeleiro e do ipê; flor de roça; flor de terreiro; músicas de passarinho e com o canto do galo; encantos que não germinam em qualquer lugar nem todo mundo pode alcançar.

CARTA DE UM PROFESSOR DOENTE A PROPÓSITO DO SISTEMA CAPES/CNPq/MEC/MCT. ETC

CARTA DE UM PROFESSOR DOENTE A PROPÓSITO DO SISTEMA CAPES/CNPq/MEC/MCT. ETC *




Estou doente...

Produzo mais papéis e máquinas e menos seres humanos, indivíduos! A nossa era se chama “PRODUÇÃO CIENTÍFICA”...

Quanto? Preciso estar “on line” e ligado 24 horas para produzir: 5 artigos por ano, pelo menos 1 Qualis A e os demais podem ser A2, B1 ou B2, mas o resto não interessa; pelo menos 1 livro e um capítulo de livro por ano.

Ah! Não posso esquecer das comunicações em eventos! Devem ser preferencialmente trabalhos completos, publicados nos anais em Congressos Internacionais porque os resumos expandidos e os simples não contam nada na nossa avaliação. E se forem em eventos regionais ou locais menos ainda.

Devo participar de 2 Programas de Mestrado como efetivo e um terceiro como Colaborador.

Devo ministrar 4 ou 5 disciplinas na Graduação, ou se não for assim preciso ter 4 ou 5 turmas, com pelo menos 50 vagas ofertadas para ministrá-las. Muitas das vezes, em espaços que comportariam muito menos... Quantos créditos: 12, 16, 20 ou 24 por semestre?

Devo ministrar também 1 ou 2 disciplinas na Pós-Graduação. Preciso orientar os trabalhos de conclusão de curso (4 ou 5, às vezes só um pouco mais por semestre). Preciso orientar pelos menos dois estudantes de Mestrado por ano... Ah! Eles precisam defender suas dissertações em 24 meses... O ideal já seria defender em 18 meses! E os Co-orientados? Quantos?

Tenho ainda os estágios, os projetos de fomento e de PIBIC. Ainda faltam as comissões e os cargos administrativos!

Precisamos de mais cursos, mais disciplinas e mais estudantes, mais cargos e mais comissões... Assim, ganhamos mais TRABALHO e temos menos VIDA. Meu tempo está acabando... O dia é muito curto e as 24 horas já não me são mais suficientes.

Que tal repensarmos o nosso Calendário? O dia poderia ser um pouco maior e o ano poderia ter mais alguns meses... Puxa! Como seria feliz por isto... PODERIA TRABALHAR MAIS! Muito mais, pois ainda preciso ser bolsista de produtividade. Quero também ser pesquisador!

Antigamente, o Professor era Senhor ou Senhora, um segundo pai ou uma segunda mãe, um tio ou uma tia. Era também um EDUCADOR. Um erudito e um verdadeiro HERÓI. Hoje o professor “brother”, “chapa”, “meu”, “brô” e “véio”, entre outros... Muitos outros!

O bom é que temos mais professores. Muito mais! Por outro lado, temos menos salas e dividimos os nossos 15m2 (chamado gabinete) com mais 3 ou 4 e todos os seus orientandos também. Pelo menos não posso reclamar de solidão no trabalho, nem de monotonia. A vida de Professor é pura agitação... Altas baladas como dizem.

Meu dia de trabalho terminou na Instituição... A jornada de trabalho de um celetista é de 44 horas por semana, com tendência natural de reduzi-la. E a nossa de professor? Isto é muito pouco!

Além da nossa rotina diária, ao chegarmos em casa precisamos continuar TRABALHANDO! Tem as correções de provas, aulas e notas de aulas para serem preparadas, seminários, palestras, etc.. Ou melhor, fazer invencionices para melhoramos a nossa performance para nossos estudantes.

As aulas não são mais atrativas... Eles dizem: melhor seria estar com a Galera ou a Turma... Atender celular, passar minhas mensagens, jogar meus novos games do celular, msn, orkut, facebook, mostrar meu aparelho de celular novinho ... Tem muito mais opções! Perder tempo com estas aulas? Que tédio! Tudo está na Internet mesmo.

Esqueci da elaboração dos projetos! Preciso de recursos financeiros para realizar alguns trabalhos e o prazo se encerra amanhã. Ainda bem que o envio é on line. O sistema, hoje em dia, em alguns editais recebem até 24 horas depois... UFA! Vai dar tempo.

Aqueles que precisam da nossa atenção em casa: mãe, pai, esposa, marido, filha, filho, neta, neto, noiva, noivo, namorada, namorado... Gato, cachorro, peixe, papagaio, periquito... etc? ELES PODEM ESPERAR!

E as minhas necessidades: físicas e fisiológicas? E o meu lazer e meu prazer? Confesso que às vezes me sobra um tempinho para isto tudo, apesar de serem atividades menos nobres.

Preciso dormir, mas tenho que TRABALHAR! Preciso acordar, antes de dormir. Estou doente! Não tenho tempo de ir ao médio... Depois vejo isto! Estou gravemente doente, mas não posso me curar. Preciso TRABALHAR e PRODUZIR mais papéis (textos, livros, artigos, relatórios, etc...). Meu CURRÍCULO LATTES está desatualizado!

Tenho que produzir mais máquinas também, pois o mercado assim exige.
Fico triste no final. A maior parte de toda a minha produção permanece intocável e, na maioria das vezes, enfeitando estantes e gavetas. Poucos realmente lêem aquilo que é fruto de uma vida inteira de total entrega ao sistema. Ou no caso das máquinas, algumas ficam sem emprego.
Ah! Eu não posso me queixar, pois apesar desta pequena carga de trabalho tenho um bom salário.


“Não sois máquinas! Homens é o que sois” é uma famosa frase de Charles Chaplin, ou ainda “O que somos é conseqüência do que pensamos” de Buda. Acredito que isto é coisa do passado... Está fora de moda!

Podemos ver que a geração atual não os conhece, pois seus mais recentes ídolos e sua identidade são diferentes: “Exterminador do Futuro – Arnold Schwarzenegger”, “Rambo – Sylvester tallone”, “Indiana Jones – Harrison Ford”, “007 - Daniel Craig”, etc. Estes são os verdadeiros heróis: imbatíveis, incansáveis e imortais.

Estou doente... Gravemente doente... Incurável...

AQUI JAZ um EX-PROFESSOR que um dia sonhou ser PESQUISADOR.

(*)Prof. Dr. Robério Anastácio Ferreira
Universidade Federal de Sergipe

Departamento de Ciências Florestais
Mestrado em Agroecossistemas
Mestrado em Ecologia e Conservação

Obs.: esta pérola chegou a mim por envio do Professor Puscas, da Universidade Federal do Piauí – UFPI.

domingo, 17 de outubro de 2010

ONTOLÓGICO

Ontológico
Identidade do humano no mundo

Áureo João. 43. Teresina/PI. inspirado em 08.11.2009

Eu quero ser
Eu quero ser o que eu não sou
Eu não quero ser o que sou

Eu quero ser
Um ser divinizado,
Fora do conflito do bem e do mal, onde assim for,

Eu quero ser Deus
Incriado, incausado, atemporal, princípio de princípio, medida de tudo;
Dono de si mesmo, regente e regido em si e por si;

Eu quero ser conhecedor da substância da água, do fogo, dos ventos, do pó e do sopro vital,
Eu quero ter consciência da consciência de ser
Eu quero saber o ser distinguir-se e distinguir-se dos entes mais

Eu quero ser o diabo: Imprevisível, vigilante, auto-observador de si mesmo; temido; aniquilador;
Caminhar nas profundezas das águas, molhar e não se afogar,
Atravessar na chama, dançar com o fogo e não se queimar,
Voar nas tempestades, cair sóbrio, levantar consciente e não se perder de si,

Não podendo ser, eu quero ser
Ser um bom fazedor; ainda que de perguntas, de respostas;
Quem sou? Onde estou? Como estou? Com quem estou?
Ou de si mesmo

Ser o ser que não tem medo de si mesmo.
Não podendo ser além-homem, meta-homem, mais que gente, mais que humano,
Que humano e gente seja, agora e sempre!!!

sábado, 16 de outubro de 2010

OS POBRES - poema, poesia e filosofia

OS POBRES


Áureo João. 43. Teresina/PI, 15/10/2010.

1.
Pobres. Há pobres. Ah! Os Pobres!
Há pobres humildes, oprimidos, sofridos, desvalidos, nunca esquecidos;
Mais que estes só os empobrecidos, excluídos, humilhados e reprimidos, mas igualmente jamais esquecidos!


2.
Há pobres. Os pobres sempre lembrados e amados;
Bispos, padres e missionários rezam aos pobres, clamam pelos pobres, vivem por causa dos pobres!
Os pastores arrebanham os pobres e oram pela existência dos pobres; e fazem obras por causa dos pobres!


3.
Profissões se criam e se sustentam por causa dos pobres;
Instituições políticas, religiosas, filantrópicas, entidades assistencialistas e revolucionárias se edificam em função dos pobres!
O amor aos pobres é notório, há quem conte; é contábil, monetário!


4.
Ah!!! Os pobres!!!
O que seriam os pobres sem os exércitos caridosos, assistencialistas, filantrópicos, missionários e revolucionários – todos por causa dos pobres – sempre vigilantes à sua contagem e contabilidade?!!!
Estes aliviam a dor dos pobres, consolam seus sonhos; nutrem suas vidas; e regam sonhos seus;


5.
Há pobres e há não-pobres,
Toda moeda tem dois lados: os pobres, os empobrecidos e o criador pendulam sob essa lei;
O que seriam os soldados dos exércitos caridosos, assistencialistas, filantrópicos, dedicados em missões por causa dos pobres, sem o exército dos empobrecidos?!! Que vestimentas os cobririam? Que carruagens os transportariam? Que abrigos seriam seus lares?


6.
Há pobres crianças, pobres jovens, pobres idosos!
Há pobres negros, pobres meninas e meninos! Há mendigos!
Mais que estes só os negros, crianças, jovens e idosos empobrecidos, excluídos, humilhados e reprimidos; mas estes também são muito e sempre lembrados, nunca esquecidos!!!


7.
Há pobres em categorias, mas sempre lembrados e amados;
Pronunciados em grandes discursos, reuniões de gente grande e nos colóquios íntimos em diminutivo: “Ah! Meus negrinhos, onde estão a essa hora!!!?”; “Ah! Minhas pobres criancinhas de rua, abandonadas, onde estão se protegendo desse temporal e do frio?” “Ah! Meus velhinhos”; “Meus moradores de rua”; “meus faveladinhos”!!! "Meus quilombolinhas"...
Mais que isto só as arrecadações recolhidas por causa dos pobres!


8.
Há pobres na cidade, no espaço rural, nos quilombos e no coração de florestas; todos sempre lembrados e nunca esquecidos!
Juntando todos são muitos, mas há quem os conte; é contábil, monetário;
Mais que estes todos juntos só o poder detido, escudado, protegido, dominado, vigiado e mobilizado por aqueles que vivem por causa dos pobres!


9.
Há fé absurda em defesa dos pobres!
Se os pobres não vêm até a fonte da fé dos exércitos que amam e defendem a vida por causa dos pobres, a fé vai aos pobres, até àqueles empobrecidos, excluídos, humilhados, das ruas, das favelas, da pobreza rural, dos quilombos e até àqueles do coração da floresta;
Mais que essa fé só a fé na vida vivida por causa dos pobres!!!


10.
Há pobres que nascem!!! Há não-pobres que vivem porque nascem os pobres!
Há pobres que são abortados, ainda que seja árduo o sacrifício dos exércitos para evitar esse infortúnio! Há perdas incontáveis, mas há quem as conte; é contábil, monetário;
Maior que esse sacrifício só a esperança na continuidade da vida dos pobres e a dor pela perda por causa dos pobres abortados!


11.
Há pobres que dormem a vida, por causa da vida de empobrecidos;
Mas toda moeda tem dois lados: os pobres, os empobrecidos e o criador pendulam sob essa lei;
Mais que isso só os sonhos dos empobrecidos, sonhados em muitos, capazes de acordar do sono algoz que lhe dorme a vida empobrecida...
... ... ...

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

ETNOCÊNTRICO - poema, poesia e filosofia

ETNOCÊNTRICO


Áureo João. 43. Teresina/PI


Aquele que não nasceu no meu lugar padece de infeliz sorte do destino, por não merecer a originalidade de uma digna naturalidade de nascença; não terá pior sorte em sua vida, se for mesma sua, se devotar-se ao lugar de minha nascença;


Aquele que não tem beleza corpórea igual à minha: minha raça, minha cor, minha linhagem; não pode-se dizer belo; poderá apenas admirar a beleza que é minha e não sua;


Quem não aprecia minha comida e minha bebida, sem iguais, não tem bom paladar, não tem bom estômago e não é herdeiro de bom gosto, nem de fina culinária;


Aquele que não foi embalado nos tecidos que me embalaram não vem de berço que se possa admirar, preservar e salvaguardar;


Quem não se veste tal como às minhas vestes não tem faculdade de Inteligência para discernir o elegante do ridículo;


Aquele que não sabe meu saber, não sabe; nem sequer sabe do meu tipo de compaixão para aliviar sua triste sina, merecida somente quando revogar seu não-saber e outorgar meu-sumo-saber; sua fortuna, coube-me por encontrá-lo e descobri-lo;


Aquele que não faz o que eu faço e como faço o meu fazer, não possui um sofisticado fazer neste mundo que é meu, nem tem o que ensinar nem o que continuar;


Aquele que não alcança o êxtase do choro, do riso e da contemplação refinada com minhas artes, minhas músicas, meus enredos, não terá outra reserva a não ser o lamento desafinado e poluente de suas cordas vocais, de seus instrumentos e por suas criações inferiores;


Aquele que não crê no Deus que me rege não conhece a Deus verdadeiro;
Quem não crê nas mesmas minhas crenças não sabe crer;
O outro que não anda como eu, sequer aprendeu a caminhar. Terá boa sorte, se eu puder carregá-lo.
Aquele que não escolheu a minha escolha, não tem uma escolha porque não o sabe fazer, mas lhe será ensinada a minha em todos os seus dias;


Aquele que não é como sou, não é sequer.


quinta-feira, 14 de outubro de 2010

INDIGNA BONDADE - poema, poesia e filosofia

INDIGNA BONDADE


Áureo João. 43. Teresina/PI.

1.
Eu ensinei a meu filho as funções de comer, beber, andar, falar e fazer outras faculdades biológicas,
Eu aculturei meu filho no lugar, no tempo, na história de seu contexto e num destino infalível;
Eu lhe inculquei o valor supremo da obediência a mim, aos mais velhos, à ordem, ao que lhe foi ensinado tal como tal, sem lhe deixar a necessidade de perder tempo em investigações sobre as causas primeiras e últimas das coisas;
Eu lhe eduquei a respeitar a Deus, sobre todas as coisas, e torná-Lo inquestionável pela fé absurda;
Com este feito, conto com a certeza de sua conduta sempre previsível, inalterada e linear, sem nenhuma desobediência criativa; ele não haverá de contrariar minha bondade e o bem que lhe reservei.


2.
Os pais, presente que Deus só nos dá uma vez na vida, ainda que a cultura nos possa mais de outra!
Não sei do que será de mim, sem a presença e o amparo de meus pais!
Temo que eles um dia morram!
Nesse dia terrível, sinto que não me haverá mais sentido em viver neste mundo!
Pelo menos a herança, para compensar esse vazio, eu farei tudo o possível para deserdar os demais de direito, o primogênito e o derradeiro, para que eu possa preservar e zelar pela lembrança e saudade dos meus entes amados! Cada um saberá que é para o bem de todos!!!


3.
Em me achando diante de alguém vazio de sonhos, eu o convencerei a construir sonhos seus!
Já tendo sonhos construídos, eu o convencerei a acreditar em seus sonhos ainda que outros não!
Já confiante em seus sonhos, eu o farei acreditar que é possível realizá-los, ainda que a persistência lhe seja necessária e o custo seja elevado!
Eu, ainda, o acompanharei para testemunhar suas vitórias e contar seus sucessos!!!
Assim, quando usufruir da colheita, eu quero estar na primeira fila da divisão dos bônus, sem quaisquer ônus, e sempre lembrado de (por) uma obra impagável; ele não haverá de esquecer minha bondade e o bem que lhe fiz, mesmo que seja necessário lembrá-lo sempre.


4.
Em podendo ajudar ao próximo, eu o farei com a mais convicção e exposição possíveis de serem notadas!!! Assim, aquele jamais me negará um sacrifício!
Em podendo defender o direito do outro, eu o advogarei firmemente perante seu algoz, seu destino, sua sina ou má sorte! Feito isto, ele certamente renunciará parte dos seus mais nobres direitos e valores e, quem sabe, até a alma, em minha recompensa!
Aos entes empobrecidos, aos de má sorte, aos carentes de amor e de matéria, eu não lhes negarei uma farta caridade; eu lhes anunciarei a grandeza e a bondade raras dos ricos, a boa sorte de berço dos afortunados, a alegria dos merecidos de amor e matérias. Isto, lhes trarão conforto, ainda que breve desejo;
Aos inquietos e aos irrequietos, eu lhes ensinarei que a paciência ilimitada e a esperança eterna e passiva serão lembradas e recompensadas por Deus, ainda que depois da morte;
Essa caridade não ficará no anonimato e constará dos relatos, dos mais diversos registros e linguagens possíveis à época, para que mortais sejam lembrados de meus gestos e que Deus não possa me negar a salvação e o paraíso, por mérito dessa bondade!!!


Indigna.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

O CAPITALISMO NO FUNCIONAMENTO DO ESTADO

Influências do capitalismo contemporâneo na dinâmica de funcionamento do Estado: para compreender o Estado neoliberal e não querê-lo fortalecido.



Teresa Cristina Coelho Matos
Assistente Social, Especialista em Gestão de Organizações Públicas e Sociais pela Universidade Estadual do Piauí - UESPI, Mestra em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Piauí – UFPI. E-mail: teresacmatos@uol.com.br

NÃO VOTE EM SERRA!



INTRODUÇÃO

A sociedade contemporânea tem como marca relevante o fenômeno da globalização, que alterou, e continua alterando, os modos de produção, as fontes de riquezas, os valores e os sistemas de poder. Nesse contexto, muitos Estados foram impelidos a empreender reformulações em sua estrutura para se tornarem compatíveis com essa nova ordem econômica e social caracterizada pelo capitalismo global que ampliou, em grande medida, as desigualdades sociais.
Investigar essa tese requer uma incursão pela história destacando-se os eventos mais significativos no processo de transformação da sociedade, que influenciaram na modelagem do sistema capitalista ao longo do tempo e na estrutura de funcionamento do Estado, para, em seguida, incorrer sobre o movimento global de reforma do Estado, desencadeado na década de 1980 e ampliado na década de 1990, desencadeado no Brasil pelo Governo de Fernando Collor de Mello e consolidado pelo Governo de Fernando Henrique Cardoso.
Recorrendo a estudos produzidos sobre o tema, buscou-se destacar a interferência do capitalismo contemporâneo na definição e implementação das estratégias de governo voltadas para realizar esse projeto reformista que, em tese, propunha-se a promover a estabilização econômica, a reinserção internacional e a institucionalização da democracia, mas de resultados desastrosos no vivido social.

1. OS CAMINHOS TRILHADOS

A fase atual da sociedade foi moldada por mudanças significativas no seu sistema de valores, por significativas alterações nas relações de produção e no seu aparato institucional, e foram muitos os eventos humanos e os fatos que tiveram importância na formação desse modelo de sociedade caracterizado pelo capitalismo global, dominado pela revolução das tecnologias e pelo poder do conhecimento e da informação.
A Revolução Industrial, ocorrida entre os séculos XVIII e XIX está entre os acontecimentos de grande significado na modelagem da sociedade atual, pois marcou a substituição dos processos manuais de produção pelos processos industriais mecanizados e estabeleceu o desenvolvimento do capitalismo industrial (CANTANHEDE,1983, p.83).
Seguindo o curso da história, no período que se segue à Segunda Guerra Mundial ocorrem novas mudanças no cenário da sociedade. As premissas de Marx sobre a reprodução do sistema capitalista são materializadas: a ciência passa a ser utilizada como fator de produção, os instrumentos de trabalho são aperfeiçoados, os meios de comunicação e de transporte se modernizam, surgem os grandes centros urbanos e a centralização dos meios de produção em grandes corporações.
A partir daí as forças produtivas do sistema capitalista foram reforçadas e o capitalismo da economia mundial de hoje começa a tomar formato, sobretudo com a modernização dos transportes e com a utilização da ciência na produção.
É nesse período que se inicia a liberação de fluxos comerciais internacionais, estimulada pelos Estados Unidos, que saem fortalecidos da Segunda Guerra Mundial, com status de nação hegemônica, e nessa posição, com o argumento da racionalidade econômica, passam a estimular a interligação das economias, com o interesse de defender a sua posição de vanguarda nos setores industriais mais atuantes e de controle dos principais circuitos financeiros e comerciais (FURTADO,1992).
É nesse período, também, que o cenário socioeconômico de vários países passou a ser fortemente influenciado pela ideologia socialista de defesa da propriedade social dos meios de produção e da distribuição igual das riquezas, para combater a ideologia capitalista de produção social e da propriedade privada, de estímulo ao lucro crescente do capital e os seus efeitos na sociedade: desigualdades, desemprego e exclusões.
Pelos estudos feitos por Lester Thurow (1997), essa tendência de domínio do socialismo sobre o capitalismo forçou as economias capitalistas a adotarem uma mentalidade defensiva global, iniciada pela ajuda externa que os Estados Unidos deram aos países do terceiro mundo, com o objetivo de garantir parceiros fortes para combater o comunismo que se expandia.
Esse período, compreendido entre o término da Segunda Guerra Mundial e o início dos anos de 1970, é conhecido como a “era de ouro do capitalismo”. O Estado, nesse período, estava estruturado para exercer a função relevante de controle e de ordenação das atividades econômicas, dentro de uma visão desenvolvimentista de expansão dos mercados internos.
A partir de 1973, conforme afirma Fiori (1996), a estrutura econômica da sociedade passa por um desajuste que compromete a sua estabilidade. Inicia-se a crise das políticas econômicas nos países centrais, das políticas de proteção social dos “Estados de bem estar” e das políticas de industrialização dos países subdesenvolvidos. Europa e Estados Unidos passam a enfrentar altos níveis de desemprego e os paises da América Latina, como o Brasil, passam a enfrentar o endividamento interno e externo, déficit público, hiperinflação e desaceleração da economia (THUROW, 1997).
Os fundamentos do capitalismo: estabilidade financeira, pleno emprego, salário em ascensão e crescimento, foram abalados, não estavam sendo vivenciados no cotidiano da sociedade. A realidade passou a apresentar-se sob a forma de recessão, demissões, desempregos e queda de salários reais, provocando uma queda no padrão de vida e proporcionando o crescimento da desigualdade social.
Diante desse cenário, em todo o mundo, Estados reformulam seus aparelhos e redefinem o seu papel para se adequarem a essa nova etapa da vida social, marcada pelos imperativos da globalização e da reestruturação capitalista, tornando-se forçoso a reformulação de sua estrutura organizacional para garantir a produtividade e a competitividade da economia, preservar os interesses gerais do capitalismo global e responder às grandes demandas sociais surgidas ao longo do processo de transformação da sociedade.

3. O MOVIMENTO GLOBAL DE REFORMA DO ESTADO

O movimento de reforma do Estado na sociedade contemporânea evidencia a concepção de Claus Off de que o Estado capitalista é “uma forma institucional do poder público em relação com a produção material” (1984, p.123). Assim, em 1989, os sete países mais ricos do mundo (Estados Unidos, Alemanha, Canadá, Japão, Inglaterra, França e Itália) selaram um acordo estabelecendo diversas políticas voltadas para a implantação de um novo modelo de Estado, fundado sob as bases da concepção neoliberal, - (ref. Doutrina desenvolvida a partir da década de 1970, para adaptação do liberalismo clássico às exigências de restrição ao Estado interventor e assistencialista na economia, devendo exercer controle do funcionamento do mercado em grau mínimo e apenas em setores considerados imprescindíveis) -, tendo em vista atender aos interesses de acumulação do capitalismo global.
Nesse acordo, conhecido como Consenso de Washington, definiu-se um conjunto de estratégias para a formação desse novo Estado, quais sejam: a) ajuste fiscal, para diminuir os gastos do governo e reduzir o déficit público; b) redução do aparelho de Estado na provisão de bens e serviços públicos; c) privatização, através da transferência de empresas sob o controle do Estado para a iniciativa privada; c) criação de espaços políticos para a participação da sociedade na fiscalização dos gastos públicos.
Considerando que o Governo é o centro propulsor e unificador do Estado; a estrutura de comando que imprime as regras para que sejam cumpridas as orientações políticas do Estado (BOBBIO, 1999), na década de 1990 os governos de diversos paises do mundo, dentre os quais o Brasil, sob os comandos de Collor de Mello e de Fernando Henrique, empreenderam o movimento de reestruturação do Estado, centrando esforços para “modernizar” e “agilizar” sua base institucional de gestão, a Administração Pública.
Destaque-se que, a centralidade do movimento global de reforma do Estado foi o de dotar a administração pública de eficiência e eficácia pelo entendimento que a estrutura existente não atendia às necessidades dos governos e nem ao interesse público. Para isso os mecanismos utilizados pelos governos seguiram as estratégias definidas pelo Consenso Washington: a) limitações das dimensões do setor público; 2) privatizações; 3) comercialização ou corporização do setor público; 4) descentralização para governos subnacionais; 5) uso de mecanismos típicos de mercado; 6) novas atribuições aos órgãos da administração central, visando a “racionalização” (KETIL, 1998).
Os estudos de Donald Ketil apontam que o que levou cada país a definir os seus programas de reforma foi a natureza das suas forças políticas e das instituições de cada um deles e que, as diferenciações apresentadas nesses programas são influenciadas pela diferenciação dos cenários geográficos e culturais, das suas riquezas acumuladas e da importância dada à geração do conhecimento. Assim, em alguns países deu-se maior importância ao papel social do Estado e em outros ao fortalecimento do mercado.
Nos Países latino-americanos as reformas do Estado seguiram principalmente as tendências de revisão do seu tamanho e do seu papel, pela via das privatizações e da terceirização na provisão de bens e serviços públicos. Situação identificada no projeto reformista do Estado brasileiro, apesar de seus formuladores o apresentarem sob um discurso crítico ao neoliberalismo; defendendo uma reforma de base social-liberal, - (ref. corrente política de cunho reformista, por via democrática, originária da doutrina revolucionária socialista e marxista de 1917, mas que no contexto do Estado capitalista contemporâneo visa a melhoria das condições de vida dos trabalhadores sem comprometer os interesse do capitalismo global) -, apresentada, nas palavras de Bresser Pereira (1999), como a que melhor soube diagnosticar as crises estruturais enfrentadas pelo Estado brasileiro diante dos imperativos do mundo globalizado.
Porém, a concepção reformadora, na prática, estava fortemente concentrada na diminuição do Estado e na valorização do mercado, sendo veiculada para a sociedade como estratégia para preparar o país e ajustar sua economia para a nova competitividade internacional, tendo, para isso, que se livrar de uma herança de décadas anteriores na qual o Estado era gigantesco, ineficiente e perdulário (NOGUEIRA, 2005).
Nesse sentido, os formuladores dessa matriz do Estado brasileiro apontaram como práticas necessárias a transferência para a iniciativa privada das atividades que podem ser controladas pelo mercado (privatização das empresas estatais) e a descentralização para o setor público não-estatal de serviços que não envolvem o exercício do poder do Estado, mas devem ser subsidiados por ele, como educação e saúde.
Contudo, vale ressaltar que devido ao avanço da vida democrática na atualidade, emergem nesses países um movimento de conscientização de que mercado e Estado não são os únicos organizadores da vida social e que os movimentos organizados da sociedade são partes integrantes e peças fundamentais nessa tarefa.
Assim, além de empreender o ajuste estrutural da economia e a reforma do aparelho administrativo do Estado tornou-se necessários empreender um processo de democratização, com a adoção de uma variedade de medidas voltadas para assegurar a participação da sociedade civil na reconstrução do Estado e na delimitação do alcance regulador do mercado, incluídas no texto da constituição de 1988, que estabelece novas bases de relação entre Estado e sociedade no âmbito da gestão pública.
Nesse sentido, é ilustrativo, na realidade brasileira, a constituição e consolidação de conselhos gestores de diversas políticas e programas sociais, a prática do orçamento popular em várias cidades, bem como a realização de conferências para consulta popular, em nível nacional, estadual e municipal, para o planejamento das ações de saúde, educação, meio ambiente, assistência social, dentre outras, com a participação garantida de representantes da sociedade civil.
Vale ressaltar que para que o processo de democratização alcance seus resultados, além desses espaços de participação popular na gestão pública, é necessário, também, a adotar conduta dialógica na busca de articulação entre Estado, agentes econômicos e sociedade civil - {ref. compreendendo sociedade civil no sentido dado por Grmsci: “ sociedade civil não é um mero terreno de iniciativas ‘privadas’, mas tem [...] uma ‘função estatal’, na medida em que se põe como ‘hegemonia política e cultural de um grupo social sobre toda a sociedade, como conteúdo ético do Estado” ( NOGUEIRA, 2003, p. 187, apud GRAMSCI, 2000)} - e, assim, criar os meios políticos para a consolidação democrática e ampliação dos direitos e da justiça social.



4. CONCLUSÃO:

Nesse estudo pode-se perceber que as propostas de reforma do Estado empreendidas nas sociedades capitalistas da atualidade, apesar de se apoiarem num discurso de defesa dos interesses coletivos, tiveram como base a concepção neoliberal imposta pelos paises ricos e reforçam a tese de que foram implementadas, principalmente, com o propósito de atender aos interesses econômicos do capitalismo global.
Dentro de uma realidade complexa, que engloba interesses diversos e conflitantes, tanto no âmbito do Estado, dos setores econômicos, quanto da sociedade civil e entre estes, percebe-se que algumas questões, ainda hoje, continuam na pauta de discussão. Como realizar uma reforma de Estado que priorize a defesa dos interesses coletivos no contexto da sociedade capitalista contemporânea? É possível reverter as práticas focadas estritamente na defesa dos interesses das elites econômicas transnacionais, internacionais e nacionais?
Dentre os caminhos apontados está o de conceber a sociedade civil no sentido gramisciano, devendo ser vista com a “função estatal” de conteúdo ético do Estado, bem como de ampliar os espaços de participação da sociedade para além da arena das políticas públicas de cunho social, garantindo seu envolvimento no debate de questões referentes à racionalidade econômica e distribuição da riqueza e assim caminhar em direção da consolidação de um verdadeiro processo de democratização e promoção da justiça social.
Reconhecidamente, esses caminhos foram ampliados pelo governo popular democrático coordenado pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e precisamos tê-los consolidados. Nesse rumo, temos como única alternativa a candidata Dilma Rousseff à presidência da República.
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VOTE EM DILMA PARA O BRASIL SEGUIR MUDANDO!
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOBBIO, Norberto. Quem Governa? In: As ideologias e o poder em crise. 4ª ed. Trad. João Ferreira, Brasília: UnB, 1999.

BRASIL, Presidência da República, Plano Diretor De Reforma Do Estado. Brasília, Câmara da Reforma do Estado, Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado, 1995.

CATANHEDE, César. Administração e Gerência. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1983.

FIORI, José Luis. Os moedeiros falsos, “neoliberalismo e políticas públicas”, “globalização e democracia”, o novo papel do estado frente à globalização, mimeo, 1996.

FURTADO, Celso. Brasil: a reconstrução interrompida. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

KETIL, F. Donald. A Revolução Global: reforma da administração do setor público. In, Revista do Estado e Administração Pública Gerencial. Trad. Carolina Andrade – 2ª ed. – Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1998.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. Um Estado para a sociedade civil: temas éticos e políticos da gestão democrática. 2° ed., São Paulo: Cortez, 2005.

OFFE, Claus. Problemas estruturais do estado capitalista. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1994.

PEREIRA, Luiz Carlos Bresser, SPINK, Peter. Reforma do Estado e Administração Pública Gerencial. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getúlio Vargas, 1999.

THUROW, Lester C. O Futuro do Capitalismo: como as forças econômicas mudam o mundo de amanhã. Rio de Janeiro: Rocco, 1997.

domingo, 10 de outubro de 2010

O ASSUNTADOR - Assuntar - poema, poesia, filosofia

O ASSUNTADOR – poema, poesia e filosofia.


Áureo João. 43 anos. Teresina/PI, 2010.

1.

Assuntar assenta em assuntar-se, em conjugação reflexiva pura;

É assentar em si mesmo, sobre e dentro de suas entranhas visíveis e naquelas não visíveis,

Para captar as manifestações e expressões extravasadas e os discursos silenciados e os dissimulados;

É perceber o corpo físico, o vital, o emocional, o mental, o intelectual, o astral e o espiritual manifestos em seu universo particular, íntimo pessoal;

É caminhar em si até sentir medo da estranheza de si mesmo e irreconhecer lugares, virtudes e ausência destas, nunca antes observados, nem declarados de sua pertença própria.

2.

Assuntar é uma conspiração em si mesmo,

É penetrar nas dimensões da direita e do avesso, assuntando-se, auscultando-se;

É dissecar o amor que sente e o ódio que manifesta, seja na qualidade exposta para fora de si, seja naquela expressão reservada de sua interioridade exclusiva;

É percorrer em si mesmo até reconhecer porque ama e como ama; porque odeia e como odeia;

Inclui ancorar na dimensão de seu amor até então desconhecido, mas também comporta em penetrar e reconhecer as dimensões da indiferença e dissimulações sobre as manifestações de seu ódio;

3.

Assuntar comporta mergulhar no amor do outro, sem se deixar contagiar de sua manifestação particular dele;

É sentir como o outro sente o amor que é seu, por aquilo que lhe faz amar;

É reconhecer porque o outro ama e, especialmente, como ama e os fundamentos da expressão de seu amor;

Comporta cuidar do seu amor particular e universal, do outro, com o saber cuidar que é, também, de seu particular do outro;

Suporta cuidar do amor do outro, sob o fundamento do outro e o cuidado que lhe é singular; que é de sua identidade, sem fundir-se nem confundir-se com o outro.

4.

Assuntar é encostar-se no ódio do outro, sem nutri-lo nem amenizá-lo;

É compreender as vibrações que enraízam no ódio do outro e as dimensões em que se realizam;

É reconhecer a causa que ativa seu ódio dele e o torna irreconhecível à rasa racionalidade humana;

É reconhecer, sob o fundamento do outro, o que lhe conforta e lhe ameniza o ódio que lhe acomete;

É pensar, sentir e auscultar o ódio do outro como se fosse ele mesmo em atividade de assuntar-se assuntando-se, em pura conjugação reflexiva e empática.

5.

Assuntar é conhecer a si mesmo, pelo direito e pelo avesso;

Em sendo uma galinha, sabe-se galinha, em suas dimensões e manifestos autênticos e em suas dissimulações;

Em sendo uma águia, sabe a si mesma águia, quando verdadeira e verossímil, não mais nem menos que a galinha que conhece a si mesma inteira;

Em sendo sábio, conhece a si mesmo primeiro, ainda que inconcluso sempre, antes que lhe seja requerido conhecer uma galinha e uma águia tal como para si mesmas;

Fora desta conjugação de assuntar assuntando-se, o sábio ignorante, a galinha e a águia são apenas e igualmente bichos importantes, que comem, bebem, dormem, reproduzem, sem saber o fundamento de si nem o propósito primeiro e último do seu ser e do seu fazer no mundo;

6.

Assuntar é uma Bela Arte em movimento e exercício que se conjugam no artífice assuntador, que é assuntador de si mesmo, que é assuntador do outro, que é assuntador do mundo, há um tempo só;

Põe-se perante Deus e reconhece as faces de Deus, seus atributos e seus propósitos, se for mesmo Deus o ente à sua mira;

Mira os olhos do Diabo e capta o intuito de sua benevolência e sua malevolência, se lhe for apropriado o atributo e significados, ainda que não se apresente Diabo; reconhecerá seu criador, seus símbolos, seus poderes e suas funções no mundo concreto e no imaterial;

Dobra-se diante de si próprio e capta o ser que é mas não quer ser; o ser que quer ser mas não o é, e o ponto de encontro de seu movimento em si mesmo;

O assuntador não teme a Deus, nem ao Diabo, nem ao outro, nem a si mesmo, porque ausculta cada um destes, porque os distingue, porque não confunde seus atributos, suas evidências, seus propósitos, suas identidades, quando os têm e quando lhes faltam; e quando lhe convém.

7.

Assuntar implica perceber cada lugar em seu lugar, enlaçado a um tempo e a seus movimentos singulares;

Se o lugar é o mato, com os bichos e os entes da natureza, então assuntar comporta conhecer os astros, interagir com a terra firme e a lama, auscultar a direção dos ventos, compreender as forças das águas, respeitar o poder do fogo, sentir as vibrações das matas e a comunicação de seus regentes;

Se o lugar é entre os humanos e seus inventos, assuntar conjuga observar e compreender os fundamentos e as intenções de seus discursos objetivados e silenciados; discernir a elaboração de seus pensamentos; sentir seu coração; compreender a conduta de suas atitudes e o fim último de seus objetos e seus significados.

Se o lugar é seu lugar, assuntar se realiza em tomar a si mesmo, predicado nas suas relações intrapessoais puras e na conjugação das relações com o lugar-mundo de ninguém, com o lugar-do-outro e com o não-lugar, e não se perder de si mesmo entre os mais;

Se o lugar é o lugar do outro ou o outro próprio, assuntar se efetiva, profunda e sutilmente, em distinguir quem é e o que é cada ente e lugar singular, mas também suas interseções e exclusões;

8.

O assuntador não é, necessariamente, generoso ou algoz;

O assuntador é porque se fundamenta assuntador;

Conjuga-se atributo do vil algoz, se algoz;

Conjuga-se atributo do digno generoso, se o for;

O assuntador é o que sabe assuntar; assuntar-se e sabe-se assuntante, auscultante em processos dinâmicos, contínuos e permanentes; é um ente que come sua comida, bebe sua bebida, dorme ou deixa de dormir ao seu modo, reproduz e produz consciente das condições que o faz; sabe o fundamento de si e o propósito primeiro e último do seu ser e do seu fazer no mundo.


... ... ... ... ...


Dedicatória a um Mestre.


Desde que fiquei sabendo da enfermidade ocorrida ao Professor Puscas, bem como de sua resistência à adversidade que lhe desafiou, fiquei emudecido sobre o assunto. Eu não tinha algo a lhe dizer, nem a lhe perguntar. Eu não tinha elogios a lhe fazer, em face do antigo corpo mais pesado, nem sobre o novo corpo mais leve, nem sobre o fumo, nem sobre a cachaça. Eu não sabia o que lhe dizer sobre sua militância na universidade, nem sobre seu momento de repouso pleno no leito do hospital e/ou em leito domiciliar, nem sobre seu retorno às lutas cotidianas. Eu apenas assuntei.!!! Assuntei sobre a grandeza de humanidade do Mestre Puscas; da sua capacidade de assuntar a si mesmo, de assuntar os outros e aos outros; de assuntar o mundo, sempre digno e generoso, sem temer a Deus, nem ao Diabo, nem aos outros e nem a si mesmo, porém sábio em distingui-los em suas identidades, em suas faces, em suas origens, em suas histórias e em seus propósitos no mundo.


É um grande assuntador. É um Mestre.


Dedico a meu Mestre Puscas um poema que acabo de “psicografar”: O ASSUNTADOR – poema, poesia e filosofia, como um gesto assuntado apreendido.


Em repouso e em movimento, que a leitura seja de bom grado ao Mestre.



Áureo João.