domingo, 21 de fevereiro de 2010

HÁ PEDRAS - poema, poesia, filosofia

HÁ PEDRAS
Autor: Áureo João de Sousa
Teresina/PI. 21.Fev.2010


Há pedras, cantos, contos, encontros e encantos,
Há pedras em cantos,
Há pedras com cantos,
Há cantos, contos, encontros e encantos em pedras.

Há pedras,
pedras em contos,
contos em pedras,
pedras que cantam

Há encantos nos cantos das pedras,
Há seres que cantam nas pedras;
Nos cantos daspedrasquecantam os contos dos cantos,
faz conto, canto, encanto e encontro, das pedras.

Há pedras filosóficas, meteóricas, metafóricas e metafísicas
Há pedras mitológicas e alucinógenas,
Há pedras em cores, colorizadas e sem cores,
Há pedras simplesmente pedras, porque o são.

Há pedras ao Vento,
Há pedras ao Fogo,
Há pedras ao Mar,
Há pedras em Terra,
Há pedras sem Lugar, e lugar sem pedra.

Há pedras, sem se ver pedras, sem haver pedras;
Há vida sem pedras, pedras sem vida,
Há pérolas; Vidas em pedras,
Vida só de pedras.

Há pedras em Corações,
Há corações de pedras,
Há pedras em pedras,
Há pedras além-de-pedras.

Há pedras jogadas na Lua,
Há pedras encantadas em Águas,
Há encontros das águas em pedras,
Há encantos da Lua nas águas das pedras.

Há pedras,
Há fadas,
Há contos, cantos e encontros,
Há Contos de Fadas nos encantos das pedras.

Há rosas entre as pedras,
Há rosas em relevo de pedras,
Há rosas de pedras,
Há pedras rosas.

Há pedras preciosas, que nos são inalcançáveis;
Há pedras não-preciosas, que nos são inestimáveis e preciosas;
Há pedras de quilates,
Há pedras de quilombos.

Há pedras em sal,
Pedras em calcanhares,
Pedras em colares,
Há pedras fundamental e inaugural.

Há pedras históricas,
Há pedras em Serra da Capivara,
Há Sete Cidades em pedras;
Há Cidades de Pedras que cantam, encantam e contam vidas.

Há pedra negra sagrada, em Meca;
Há pedras que guardam mistérios em Jerusalém,
Há pedras que unem a base ao cume, o cume ao cume;
Há pedras que ligam o sagrado ao sagrado; o sagrado ao profano; e o profano ao profano.

Há perdas no meio de caminhos, e são obstáculos que nunca se remove nem se esquece;
Há caminhos em meio das pedras, que nos afastam de obstáculos e nos elevam;
Há caminhos só de pedras, e são almejados pelo Bem e por sua Justiça;
Há caminhos e há pedras.

Há pedra eu,
Há pedra tu,
Há pedra nós;
Quantas pedras, contos, cantos, encontros e encantos,
Há de haver eu, tu, nós, enquanto houver pedras, caminhos e rosas.

REFLEXÃO:
1.Você tem algum tipo de pedra em sua existência?
2.Quais são os significados das pedras em sua vida?
3.O que seria de nós sem as pedras?

domingo, 14 de fevereiro de 2010

CORPO - poema, poesia, filosofia

CORPO
Autor: Áureo João de Sousa.
Teresina – PI, 13.02.2010

1.
Carrego um rosto,
Que tem olhos de uma cor, circunferência e área expostas,
Que tem nariz com uma estrutura e uma escultura,
Que tem boca e beiços com aberturas, comprimentos e espessuras,
Que tem geometria, com relevos, volume, texturas e simetrias;
Rosto, que não é do meu gosto.

2.
Sustento mãos,
Que produzem, organizam ou fazem seu oposto, se eu quiser;
Que acolhem, abraçam, sentem, ou afastam, conforme minha escolha;
Que expressam, indicam, cumprimentam, distinguem e me identificam,
Que podem ostentar jóias e ornamentos preciosos, raros ou simples manufaturas,
Não obstante, tem contornos, relevos, coberturas ou dimensões que me dão pouco gosto ou, mesmo, mau gosto.
3.

Ando sobre pés,
Que me suportam, com peso e massa do corpo que carrego, ainda que reclame;
Que me levam a lugares rotineiros e diferentes, simples ou sofisticados, comuns ou exclusivos;
Que podem deslizar enquanto danço, nado ou brinco,
Que podem determinar minha defesa pessoal, diante de perigos, por fugas ou ataques;
Mas, parecendo-me não ser de minha pertença mesma, rejeitam calçados mágicos, de sofisticados acabamentos ou de raro gosto, que encantam meu espírito e, sem dúvida, seriam do agrado de muitos e da inveja de outras espécies.

4.
Componho pernas, braços e troncos,
Que exibem formas, consistências e me causam muitos agrados,
Que tomam proporções físicas e comportam valores estéticos, ora controversos, ora confortáveis; Que me dão presença e diferença entre os outros,
Que me plasmam numa identidade pessoal,
mas me negam a vestimenta que desejo, o acessório que me agrada, no desenho que pretendo, e no tamanho que é meu gosto.

5.
Carrego um corpo, profano e sagrado,
Que nu e só, e solto, diante do espelho,
Vejo formas, geometrias, assimetrias e expressões de artes,
Que não estudei na escola,
Que não aprendi a admirar,
Que me pesa em tolerar e, embora não seja desgosto, não me é do melhor dos gostos.

6.
Que fizeram a Deus, autor da criatura,
Que guarda e retém o sopro vital, por seus incriados modos,
Que anima a vida, já no primeiro encontro com o corpo todo, ao nascer,
Que Lhe pudera abalar a onisciência, onipotência e onipresença, ainda que em brevíssima distração divina,
Que fizera entrar e andar o espírito que sou no lugar-corpo que não sou de bom gosto,
Pois sendo Deus inteligência pura e em sua plena vigilância, como pode ter errado a sintonia de gostos deste espírito e deste corpo? Ou, por mesma inteligência, fizera a seu propósito?

7.
Que fizeram à Natureza, poderosa e criadora,
Que, sendo mãe, possa-lhe ter causado arrogo,
Entre o criador e a criatura,
E, por obra final, tenha feito por si mesma, seu próprio gosto,
Que, sendo-me mãe soberba, pretenderia alguma vingança ou protesto comigo?
Deixou-me um rosto, um corpo, que chego até sentir vergonha, pois não me é de alto gosto.

8.
Que fizeram aos sábios humanos, inventores e mantenedores das ciências, das culturas, dos ídolos, das coisas, do mercado, do consumo, dos significados e da ressignificação de cada um de seus inventos?
Que fizeram aos artistas, que moldaram as artes e as estéticas, concretas e subjetivas, frias e quentes, em discursos incontáveis?
Que fizeram aos mitos e filósofos, que plasmaram sujeitos e seus imaginários, inventaram o belo e o não-belo; ou desnudaram-lhes!
Que predicaram gostos não antes vistos, nem percebidos, intuídos ou consumidos,
Que sendo, meu espírito, consumidor de suas criações, não pode consumir um corpo que lhe dá mais belos gostos de ter, andar, vestir, mostrar e interagir com outros espíritos de seu tempo;
Que sendo justapostos, meu espírito e meu corpo, não possam sintonizar idêntico rosto, mesmo corpo e mesmos gostos!

9.
Tenho um corpo, sensível e idealizado,
Que é cárcere de um espírito, de um imaginário, de um tempo, de um lugar; ou, do contrário, prisioneiro destes;
Que me causa medo de ouvi-lo, de auscultá-lo autêntico;
Sinto que se pudesse falar por si mesmo, em minha ofensa, haveria de me investigar perante Deus, à Natureza, aos humanos e às coisas:
Por que este espírito encarnou-se em um corpo que não lhe pode ser justo, próprio, adequado e merecido?
Por que este espírito habita em um corpo que não lhe pertence?

10.
Suplico a Deus e às forças dos entes sobrenaturais! Se o feito for de seu ofício, para que, em próximas reencarnações, façam-me serviço completo, perfeito aos critérios divinos e aos olhos e aos gostos dos entes mortais de seu tempo e lugar.

Imploro perante a Natureza, mãe e regente dos fenômenos físicos e vitais! Se a obra for de sua arte, para os acabamentos que couber em seu dever;
Apelo às ciências: ocultas, metafísicas, positivas, clínicas e estéticas! Se a incisão couber a seus instrumentos;

Aconselho-me a os entes humanos, meus pares mortais e inacabados! E, por último destes, a mim mesmo que, talvez, por arbítrio livre e singular, seja a primeira e última instância que me cabe recorrer:

O que há de se fazer? Que feito há de ser providência última e primeira?
Mudar o corpo para agradar ao espírito ou mudar o espírito? Ou o imaginário coletivo que embriaga o corpo singular e seu espírito, tornando-os irreconhecíveis? E que medidas serão justas, ao corpo e ao espírito para, a um só tempo, alinhar corpo, espírito e gosto?

/////////////////
REFLEXÃO:

1.Já lhe ocorreu perceber inconformidades entre seu corpo e seu espírito; entre a expressão manifesta em seu corpo e o discurso do imaginário coletivo que influencia seu ambiente sociocultural?

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

A COISA E A COISIFICAÇÃO HUMANA - poema, poesia, filosofia

A COISA E A COISIFICAÇÃO HUMANA
Autor: Áureo João de Sousa
Teresina/PI, 10.02.2010

Hoje, eu adquirir uma Coisa.
É bela; assim eu aprendi a adorá-La;
É valiosa; por isso guardo e A protejo com segurança e vigilância permanentes;
É exclusiva, singular, apesar de não parecer;
Veio ao mundo para mim; ou melhor, eu estou neste mundo para reverenciá-La!!!

Hoje, eu tenho uma Coisa.
É divina em mim;
É tão intensa Sua presença em mim que parece que Ela é que tem a mim;
É fortemente desejada por outras pessoas também, mas nem todas A tem; por isso, devo enaltecê-La, exibi-La, sempre;
É fascinante fonte de poder e atração mágica; por isso, devo reservá-La, escondê-La, para não perder sua exclusividade comigo, sempre;

Hoje, eu recebi a graça de uma Coisa. Posso sentir. Sinto!
É uma Coisa que nutre minhas alegrias cotidianas;
Com Ela, sinto ânimos por causa de Sua companhia;
Com Ela Mesma, também sinto medos, por causa do que representa Sua Companhia Mesma;
Toma-me o medo de não adorá-La o suficiente para merecê-La;

Ontem, minha vida se fazia sem Sua presença onipotente, onisciente, onipresente;
Sem tê-La em minha alma e em meus pensamentos, pobre de mim, não sabia da suma importância dessa Coisa em minha existência;
Tal como Deus, senão Ele mesmo inefável, oferece-me os desígnios de proteção e perigo;
Frágil criatura, tenho medo de que minha devoção não Lhe seja da medida requerida;
Obediente, sob proteção e ameaça de sua divina força, aumento minha adoração para suplicar e merecer a presença de seu espírito e de suas obras em minha alma, em meus pensamentos, em minha comida, em minha bebida, em minhas vestes, em meu abrigo; em meu ser, saber e fazer no mundo;

Amanhã, minha vida será em dedicação maior e melhor à Suma Coisa; senão criadora de mim, mas senhora de meu destino;
Em Sua devoção, eu Lhe farei oferenda todos os dias de minha vida;
Eu Lhe oferecerei valores maiores que todos os dízimos das religiões antecedentes,
Eu Lhe oferecerei meu suor, meu sangue, meu trabalho, minha inteligência;
Eu Lhe farei sacrifício maior do que fizeram Moisés e Abraão a vosso Deus; não só um filho primogênito ou um cordeiro, mas todos os meus filhos varões e as filhas, de todas as esposas, mais as esposas também; e os filhos dos filhos e das filhas; os ancestrais e os descendentes; e os carneiros e animais outros.
Amém!

Manifesto de coisificação, Deus mais poderoso não se revela, religião maior não há;
Todas as devoções e oferendas são pequenas aos Seus pés,
Verossímil ao Uno, tudo agregado em minha vida procede da emanação de seu poder,
No leito dessa processão, presto-Lhe louvor com fé absurda até que a morte me abata;
Mas quando eu morrer, quero meu corpo embalado em tecidos e ornamentos que possam Lhe guardar referência e fiel reverência; e meu túmulo ostentará sua representação, para contemplação dos vivos.
Que assim seja!

Coisa de destino infalível,
Dobro-me ao Seu divino determinismo dado a este mundo, por mérito ou castigo;
Meus dias todos começarão e encerrarão assim, de modo sempre previsível em Seu culto,
Assim seja para sempre, salvo este mundo como tal se acabe, por intempéries naturais ou por desobediência própria do gênio humano inacabado, inquieto, insatisfeito e imprevisível na História; dessa crise, muitas divindades haverão de mudar de lugar; A Coisa, certamente, haverá de ocupar outro plano.
Nesse caos, não escapará, quem viver, de tensões sobre as identidades de Deus, dos humanos e das coisas, e o lugar regido por cada um ente e cada coisa.
Aleluia!

REFLEXÃO:
1.A coisa, a mercadoria, o objeto de consumo capitalista, hoje, é uma Divindade poderosa, perante a qual dispomos nossas vidas, em sua oferenda, todos os dias, de modo tão intenso que somos acometidos de sofrimentos quando, em uma data apenas, deixamos de viabilizar sua oferenda requerida, seja na sua forma objetivada, materializada, seja em suas formas subjetivas e intersubjetivas.

2.Você presta adoração para alguma Coisa?

domingo, 7 de fevereiro de 2010

CONTRADIÇÕES DE SABEDORIAS - poema, poesia, filosofia

Contradições de sabedorias
Autor: Áureo João de Sousa.
Teresina - PI.


Eu não queria usar drogas, mas
A família me acalentou e me saciou com drogas,
A religião me doutrinou com drogas,
A escola me ensinou drogas,
A ciência me prescreveu drogas,
O mercado me vendeu drogas.

Eu consumi todas as drogas, sem escolha,
Exceto as que eu, alquimista, decantei, refutei, neguei, transmutei, transcendi,
Retribui ou devolvi,
Sem saber ou sabendo...

Eu não queria fumar, mas fumei e senti prazer;
Eu não queria beber, mas bebi com alegria e sem moderação;
Eu não queria ser inconveniente, mas eu xinguei, blasfemei, injuriei;
Eu não queria cometer pecados, mas dei vazão à ira, à inveja, à gula, à luxúria, à cobiça, à mentira, à preguiça, ao consumismo.

Eu queria ser solidário, mas me elegi ao centro do universo; cultuei a mim mesmo;
Eu queria ser puro e divino, mas adorei as coisas mundanas, amei pessoas, cativei mitos e coisas; zelei por minhas aparências, sem remorsos;
Eu queria viver no mundo das divindades, mas incorporei-me e me identifiquei com as fantasias materiais, comi carne de porco e bebi sangue de animais,
Eu queria estar entre os mais sábios, mas foram os ignorantes e os menos sábios que mais me ensinaram sobre os sábios e suas sabedorias; e não me arrependo;

Eu ouvi a mensagem de Cristo,
li o Alcorão de Alá e Mohammad,
meditei com Buda, Shiva, Khrisna e Brahma;
irradiei-me com Oxalá e Iemanjá, conversei com Lao, dancei com o Deus Sol e Tupã, dialoguei com o Profeta Gentileza,
mas não me lembrei de nenhum Deles, quando parecia razoável fazê-lo, sem me causar auto-flagelo;

Eu queria a limpeza do corpo, mas dormi sem banhar, sem escovar os dentes e sem lavar as mãos;
Eu queria ser um humano, mas comi como os bichos, dormi como bichos, amei e reproduzi como os bichos; vivi um bicho, sem queixar do presente, do passado e fiz o presente;
Estudei ciências, filosofias e teologias; decorei nomes e renomes de cientistas, profetas, poetas e mitos; citei palavras, frases, textos e tratados, mas não usei suas teorias, comprovações, especulações, nem milagres,
Eu me tornei discípulo de gurus de todas as espécies, mas resolvi a vida em pares com quem não depende de adorações e aplausos;

Eu queria escrever livros de todos os gêneros, mas foi a vida que me escreveu contos, cantos, comédias, tragédias, romances, encontros e encantos;
Contemplei cada um em seu tempo e seu lugar; vivi;
Recitei poemas famosos e anônimos;
cantei prosas, ouvi cantos e contos;
vi tragédias e comédias,
Sem querer ou querendo.

Eu queria ser pensador.
Não pensei.
Matutei-me; auscultei-me; assuntei o mundo
Não nasci pensador,
Não me fiz pensador,
Mas inquietei-me assuntador do mundo
Assuntando e assuntado.
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Reflexão:

1.Por que eu, sabendo o que devo ser e o que devo fazer, do ponto de vista da racionalidade ocidental predominante, do contrário, faço exatamente o que não devo ser nem fazer?

2.Por que eu desejo algo e sou tentado a fazer o contrário?
1.o que come, bebe (o homem animal)
2.estudos; educação (o homem intelectual)
3.espiritualidade; religião (a dimensão com a espiritualidade)