quinta-feira, 14 de outubro de 2010

INDIGNA BONDADE - poema, poesia e filosofia

INDIGNA BONDADE


Áureo João. 43. Teresina/PI.

1.
Eu ensinei a meu filho as funções de comer, beber, andar, falar e fazer outras faculdades biológicas,
Eu aculturei meu filho no lugar, no tempo, na história de seu contexto e num destino infalível;
Eu lhe inculquei o valor supremo da obediência a mim, aos mais velhos, à ordem, ao que lhe foi ensinado tal como tal, sem lhe deixar a necessidade de perder tempo em investigações sobre as causas primeiras e últimas das coisas;
Eu lhe eduquei a respeitar a Deus, sobre todas as coisas, e torná-Lo inquestionável pela fé absurda;
Com este feito, conto com a certeza de sua conduta sempre previsível, inalterada e linear, sem nenhuma desobediência criativa; ele não haverá de contrariar minha bondade e o bem que lhe reservei.


2.
Os pais, presente que Deus só nos dá uma vez na vida, ainda que a cultura nos possa mais de outra!
Não sei do que será de mim, sem a presença e o amparo de meus pais!
Temo que eles um dia morram!
Nesse dia terrível, sinto que não me haverá mais sentido em viver neste mundo!
Pelo menos a herança, para compensar esse vazio, eu farei tudo o possível para deserdar os demais de direito, o primogênito e o derradeiro, para que eu possa preservar e zelar pela lembrança e saudade dos meus entes amados! Cada um saberá que é para o bem de todos!!!


3.
Em me achando diante de alguém vazio de sonhos, eu o convencerei a construir sonhos seus!
Já tendo sonhos construídos, eu o convencerei a acreditar em seus sonhos ainda que outros não!
Já confiante em seus sonhos, eu o farei acreditar que é possível realizá-los, ainda que a persistência lhe seja necessária e o custo seja elevado!
Eu, ainda, o acompanharei para testemunhar suas vitórias e contar seus sucessos!!!
Assim, quando usufruir da colheita, eu quero estar na primeira fila da divisão dos bônus, sem quaisquer ônus, e sempre lembrado de (por) uma obra impagável; ele não haverá de esquecer minha bondade e o bem que lhe fiz, mesmo que seja necessário lembrá-lo sempre.


4.
Em podendo ajudar ao próximo, eu o farei com a mais convicção e exposição possíveis de serem notadas!!! Assim, aquele jamais me negará um sacrifício!
Em podendo defender o direito do outro, eu o advogarei firmemente perante seu algoz, seu destino, sua sina ou má sorte! Feito isto, ele certamente renunciará parte dos seus mais nobres direitos e valores e, quem sabe, até a alma, em minha recompensa!
Aos entes empobrecidos, aos de má sorte, aos carentes de amor e de matéria, eu não lhes negarei uma farta caridade; eu lhes anunciarei a grandeza e a bondade raras dos ricos, a boa sorte de berço dos afortunados, a alegria dos merecidos de amor e matérias. Isto, lhes trarão conforto, ainda que breve desejo;
Aos inquietos e aos irrequietos, eu lhes ensinarei que a paciência ilimitada e a esperança eterna e passiva serão lembradas e recompensadas por Deus, ainda que depois da morte;
Essa caridade não ficará no anonimato e constará dos relatos, dos mais diversos registros e linguagens possíveis à época, para que mortais sejam lembrados de meus gestos e que Deus não possa me negar a salvação e o paraíso, por mérito dessa bondade!!!


Indigna.

Um comentário:

  1. Mas e se por ventura existir alguem que faça "bondades" simplesmente porque viu que o outro precisava? Sem jamais ser lembrado por esse outro, sem sequer lhe ver outra vez? Sem dizer para outrem o que fez e simplesmente não mais tocar no assunto?

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